quarta-feira, 14 de outubro de 2020

CADÊ OS BANCOS DA PRAÇA DO RELÓGIO???


Nos últimos anos, o calor em Belém aumentou e ver aquele relógio bonito num espaço deserto na beira do rio, chamou a atenção de alguns amigos, mais atentos ao nosso patrimônio. A requalificação da Praça do  Relógio, ou, na verdade Siqueira Campos, sem bancos nem árvores de nenhum tipo,  provocou uma pequena discussão.

Caso se tratasse de um restauro, as calçadas teriam que ser refeitas com um dos desenhos que já tiveram; os bancos serem repostos, como em passado, e... algumas plantinhas maiores do que aquelas que a ornarão, como se fosse uma cerca viva, poderiam dar vida aqueles triângulos vazios.

A falta de bancos, porém, chegou a ofender alguns cidadãos visto que ali o movimento, principalmente de ribeirinhos  é constante: por que não recolocaram os bancos? Foi a primeira pergunta que se fizeram ao verem a praça.

Na verdade não estamos acostumados a praças sem bancos e aquela visão de um deserto com um relógio chiquérrimo, parecia até um acinte, para uns, e para outros, se era uma praça,  estava inacabada.

Dai recebemos uma resposta: Não, na verdade continua sendo uma Praça, as plantas irão crescer, tenha certeza, haverá uma cerca viva, como nas praças clássicas. Os bancos não foram recolocados porque, na verdade, as pessoas não sentam nessa Praça há muito tempo. Foram colocados bancos em várias reformas, mas em todas elas eles foram arrancados por vândalos, pois o lugar fica deserto a tarde, a noite e nos finais de semana. Serve apenas como marco visual. Infelizmente, para manter o espaço preservado tivemos de considerar a brutalidade e miséria de alguns frequentadores, que utilizam a estrutura de ferro dos bancos como fonte de renda.


A defesa da nossa memória histórica que levou ao tombamento, recentemente, de parte dos bairros da Cidade Velha e da Campina, foi deixado de lado e passou-se a discutir sobre a função dos bancos e a falta de arborização. De fato foi lembrado que: Se vocês pesquisarem em fotos antigas, constatarão que a Praça nunca teve árvores, muito menos frondosa. Isso tiraria a visão do relógio, as pessoas teriam dificuldade de ver a hora à distância.

O fato da praça do Relógio ter tido arvores não era tão notório a todos,  vista a foto acima, mas, se retiravam os bancos que existiam originalmente, podiam aproveitar e arboriza-la, a causa do aumento do calor em Belém. Era um pelo outro...e nova sugestão foi dada:  Se pesquisarem mais ainda verão que nem toda Praça tem bancos. Existem as praças contemplativas, como a do Relógio, e as praças secas, muito comuns na Europa, as quais chamamos de Largo.

Sim é verdade, a Europa está cheia de praças que nasceram na Idade Media, para valorizar os prédios que iam nascer ao seu redor: palácios, catedrais, órgãos públicos.  Nenhuma delas, até hoje tem bancos. Muitas continuam sendo, porém,  lugar de encontro, de comícios, de festas, de exposições... As nossas praças, em vez, já nasceram em idade bem mais moderna, num lugar com temperaturas altas o ano inteiro... e a do Relogio, então, é do inicio do século XX, construida no local onde tinham  iniciado a construção da Bolsa de Valores  que porém foi suspensa com a queda do preço da borracha.

 A discussão volta, no entanto, ao problema dos bancos: Se você passar por lá na madrugada, vai ver um grande rebuliço de caminhões baú e trabalhadores pesqueiros, nem tem como ficar sentado no meio daquela confusão. Outros tempos, os ribeirinhos ficam hoje na Feira do Açaí ou no Ver-o-Peso. E não pense que eu concordo com isso, porém para mudar essa realidade seria necessário uma intervenção mais ampla, não somente a requalificação de uma Praça.

Com certeza a intervenção devia ter sido bem mais ampla. Durante os trabalhos, várias vezes foram roubados os  'muros" que cercavam a praça, mesmo assim... A parte a mudança da nossa memória, o problema principal era a falta de segurança e a pobreza de quem por ali vive... mas o argumento retorna a retirada dos bancos da praça: De madrugada, quando os bancos ainda existiam várias famílias e trabalhadores ribeirinhos utilizavam os bancos para se abrigar. Qual o problema de requalificar a cidade para a população pobre usufruir dela? A área é comercial durante a noite e de dia, passam por ela trabalhadores e ribeirinhos. O problema talvez esteja na fiscalização do espaço público e na segurança... não certo tirar os bancos da praça para que a população pobre não se sente...isso é sintoma de quanto somos perversos com aqueles que usam o espaço público... e, na ilusão de querer melhorar, colocamos os problemas da exclusão para debaixo do tapete. Triste Belém

Cada um defendendo seu ponto de vista e nós com a nossa opinião: defesa do patrimônio/memória histórica e investir em segurança, não certo modificar nossa memória e prejudicar o cidadão pobre ou rico que seja.

Qual é a razão de um tombamento? essa é a pergunta a ser feita quando se decide  restaurar, revitalizar ou requalificar algo, prédio ou praça que seja. O objetivo é a preservação de bens de valor histórico, cultural, arquitetônico, ambiental e também de valor afetivo para a população, impedindo que venham a ser destruídos ou descaracterizados.

Há anos vemos ignorarem a razão de um tombamento e criarem uma nova memória, bem distante da original, ou daquela existente no momento do tombamento. Criou-se um costume: a descaracterização do patrimônio... e todos calam, consentindo assim a mudança da nossa memória. Vemos transformarem portas em janelas; mudarem as cores das casas; acrescentarem puxadinhos, e agora retiram bancos de uma praça tombada.

                QUEM DEFENDE O PATRIMÔNIO, ALIÁS, 

                              O TOMBAMENTO??? 

    QUEM DEFENDE AS LEIS NESTA DEMOCRACIA?


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