sexta-feira, 14 de outubro de 2016

QUERENDO COLABORAR

PELA SALVAGUARDA DA CIDADE VELHA

Teve inicio dia 23 de setembro de 2016 a campanha de banners da Civviva pela SALVAGUARDA DA CIDADE VELHA. É a nossa contribuição ao conhecimento da nossa realidade.

Uma atitude tínhamos que tomar frente a tanto desleixe com o bairro mais antigo de Belém. A situação de abandono desta área tombada, estava insuportável,  e, em algum modo, sentiamos a necessidade de chamar atenção a esse fato. Pensamos então em  levantar os problemas de modo diferente, e, levando em consideração quanto prevê a nossa constituição no  seu Art. 216, V, § 1º: " O Poder Público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro(...)", decidimos colaborar.

Como cidadãos, estamos de um lado como defensores,  mas também do outro, como destruidores do meio ambiente em geral. A desatenção não é somente da Prefeitura. Achamos necessário, portanto, um pouco de educação patrimonial:  evidenciar alguns pontos das nossas leis, para ajudar os mal educados a se redimirem, pois, qualquer atitude respeitosa de um cidadão para com a cidade traz em si valores positivos que, sem dúvida, ajudam a preservar o que há de melhor no lugar em que se vive, seja ele funcionário público ou não.

Nesse sentido, vários seriam os atos e ações incriminadas que, contrariamente, vemos acontecer pela cidade, com o silencio e a participação da maioria de nós. Por ex:
- depredação de monumentos e equipamentos urbanos;
- estacionamento em praças e calçadas;
- pichação (e grafitagem) em área tombada onde nossa memória deve ser ‘salva’;
- jogar lixo nas ruas;
- urinar em qualquer lugar;
- produzir/incentivar a poluição sonora e a visiva;
- etc., etc., etc.

Essa nossa ação é dirigida portanto aos ‘bempensantes’(entre os mal educados)  e é feita  através de banners colocados nas janelas e portas de cerca trinta casas de proprietários, moradores e comerciantes da área tombada da Cidade Velha que se disponibilizaram a participar..

As questões levantadas são as defendidas pelas leis em vigor. Por exemplo:
1) - Art. 30 da Constituição. Compete aos Municípios:
IX – promover a proteção do patrimônio histórico–cultural local,  observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual."
Relativamente a esse artigo fizemos os seguintes banners:
- CIDADE VELHA: vamos garantir a preservação dos bens culturais. 
- É necessário defender e preservar nosso patrimônio histórico.
- Esta rua conta nossa história: vamos conserva-la.

Outra fonte de normas desconhecidas para a maior parte das pessoas e esquecidas pelos outros,  é a Lei dos Crimes Ambientais. O silêncio é um direito do cidadão. O agente policial é obrigado a coibir essa prática desrespeitosa e promover a paz pública. A poluição sonora, que, inclusive, provoca trepidação no nosso patrimônio é crime disposto pela  Lei 9605/98, Lei de Crimes Ambientais – LCA.
2) - Art. 54. Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora E DOS BENS HISTORICOS.

O banner relativo diz: - Esta é área tombada: atenção a poluição sonora.

A Lei Federal nº 10.257/2001, o Estatuto da Cidade, dispõe que a política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, observando:
3)   art.2º inciso XII:  o dever de proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e construído, do patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e arqueológico.
A frase escolhida para o banner foi- A Cidade Velha não é terra de ninguem: vamos respeita-la.
         
A Lei Orgânica do Município prevê a necessidade de:
4) art. 38 item IV - impedir a evasão, a destruição e a descaracterização de obras de arte tombadas e de outros bens de valor histórico, artístico ou cultural;
   -Art. 116 item  VI - preservar o patrimônio ambiental e valorizar o patrimônio arquitetônico, artístico, cultural e ambiental do Município, através da proteção ecológica, paisagística e cultural;
Os banners assim dizem, repetitivamente:
- Cidade Velha: vamos garantir a preservação dos bens culturais.
- É necessário defender e preservar nosso patrimônio histórico.

A nivel municipal temos a Lei 7709/94 que dispõe sobre a preservação e proteção do 

 patrimônio histórico, artístico, ambiental e cultural do município de Belém e dá outras

providências. Lemos:

5) Art. 2º - O Poder Público Municipal promoverá, garantirá e incentivará a preservação, conservação, proteção, tombamento, fiscalização, execução de obras ou serviços visando a valorização do Patrimônio Cultural do Município de Belém.

- A Cidade Velha é a nossa memória histórica: vamos preserva-la. 
- Você está em área tombada: vamos defende-la .


Relativamente a entrada de carretas, reboques, semi-reboques  e múltiplos superior a 14m.   uma lei proibe a passagem na área urbana de Belém:
- art. 1 da lei n. 7.792 de 14/06/1996;
Quanto a proibição do transporte de cargas com peso superior a 4 ton, temos 
- art. 1 do Decreto n. 66.368/2011
Em tal senso fizemos um banner com estes dizeres:
- É necessário menos transito nesta área tombada.

Essa nossa tentativa de conscientização também levou em consideração o Código de Postura e um de seus artigos mais ignorado, é:
6) ART. 30: Nos logradouros e vias públicas é defeso:
- calçadas: II -  é defeso também transformar as calçadas em terraces de bar, colocação
 de cadeiras e mesas;
Por isso esta frase fala até dos carros estacionados sobre as pedras de liós: 
 As calçadas são para pedestres: lembre-se de não estacionar

 Em outro banner, novamente o Código de Postura está presente:
7) Art. 63: Para impedir ou reduzir a poluição proveniente de sons e ruídos excessivos...
        V - disciplinar o transporte coletivo de modo a reduzir ou eliminar o tráfego em 
        áreas próximas a hospital, casa de saúde ou maternidade;
VII - impedir a localização, em zona de silêncio ou setor residencial, de casas de
divertimentos públicos que, pela natureza de suas atividades, produzam sons 
excessivos ou ruídos incômodos;
- Transito e poluição sonora provocam trepidação: evitemos isso.

Outras informações importantes, dentro da nossa Campanha de salvaguarda da Cidade Velha são oriundas, sempre, do Código de Postura, e também são praticamente  ignoradas por todos:
8) Art 79 -Será considerado atentatório à tranqüilidade pública qualquer ato, individual ou de grupo, que perturbe o sossego da população
- Precisamos combater todo tipo de poluição na Cidade Velha.

9)  Art 81 - A administração impedirá, por contrário à tranqüilidade da população, a instalação de diversões públicas em unidades imobiliárias de edifícios de apartamentos residenciais ou em locais distando menos de 200m (duzentos metros) de hospital, templo, escola, asilo, presídio e capela mortuária. ( Pensem na igreja do Carmo...)
- Conservando a Cidade Velha, preservamos nossa memória histórica.
- Esta praça conta nossa história: vamos conserva-la.


Alguns banners fazem  referimento a problemas particulares: 
- Esta é a primeira rua de Belém: vamos salvaguarda-la.
- A Siqueira Mendes não é seu banheiro: vamos preserva-la.
 - Praças e ruas não devem ser dormitórios.
- Precisamos de segurança na Cidade Velha.

AS familias e os comerciantes mais antigos da área em questão aceitaram imediatamente de participar desta ação, o que nos deu muita satisfação.








                                                           XXX

Levando em consideração esses artigos de lei totalmente ignorados, vem a dúvida, a quem não é daqui , se estamos em democracia.  Numa democracia as leis são feitas para serem respeitadas, principalmente pelos órgãos públicos. Se elas não são consideradas ‘boas’, podem sempre ser melhoradas ou revogadas totalmente, mas fingir que não existem é ser conivente com a malandragem.

Estamos sim, em democracia, pois,  caso contrário eu não estaria aqui, podendo dizer a vocês que antes de fazer qualquer proposta para a Cidade Velha ou para toda a área tombada, seria oportuno conhecer seus problemas e tentar resolve-los, antes de pensar em qualquer tipo de projeto turístico que seja.

O ulterior desaparecimento de obras e imoveis existentes é uma perda seca e irreparável para a memoria da cidade, dos cidadãos e da própria identidade do território que a contém. A conservação dessa identidade é um objetivo estratégico de qualquer politica  cultural e precisa de instrumentos específicos dirigidos explicitamente a ela.

Eu não falei da situação das calçadas e nem da cor da água que sai das torneiras, por exemplo.  Muito menos da insegurança; nem do que acontece desde que chegaram os moradores de rua na praça do Carmo. Vamos falar disso, agora:

- calçadas: a maior parte dos problemas das calçadas nasceram depois que asfaltaram as ruas, cobrindo os paralelepípedos.  Cada vez que as tiveram de re-asfaltar, acrescentavam uma camada de asfalto ao preexistente até que um certo momento, o leito da rua era mais alto do que as calçadas. Quando chegavam as chuvas, a agua entrava nas lojas da Dr. Assis, por exemplo. O que fizeram os proprietários? Cobriram as pedras de liós com cimento... e cada comerciante fez a sua calçada de uma altura diferente. Entre a Joaquim Tavora e a D. Bosco é um verdadeiro absurdo os  degraus que encontramos em cima das pedras de liós.
Onde isso não acontece o espaço é dividido entre carros e motos estacionados; com mercadorias a venda, desde terra, areia, tijolos, telhas; com motores, bicicletas e afins sendo lavados e/ou consertados; mesas e cadeiras de bar, tudo isso no espaço destinado ao pedestre... apesar da orientação dada pelo MPE à Secon.

- A maior parte dos tubos de água da CV devem ainda ser de ferro, pois a água que sai das torneiras, é completamente marron. Por esse motivo a maior parte das casas tem poços. A UFPa fez um estudo sobre a água e descobriu uma percentagem altíssima de poços existentes por esse motivo. Muitos moradores lavam a roupa branca em outros endereços e compram agua engarrafada não somente para beber.

- A insegurança é aquela de toda Belém, com uma diferença: quando o furto acontece perto da pça do Carmo eles podem jogar embaixo das casas da baixada do Carmo, ou fugir de barco. A presença dos portos também é um chamariz principalmente no horário de saída ou chegada dos barcos,  principalmente a noite. Em vez, quando tem festa de aparelhagem ou da igreja, não se salvam nem pessoas, nem carros.

- os moradores de rua já foram expulsos da tv. Cametá. Aliás, quem teve que sair de la, foram os “marronzinhos”. Onde esse grupo de pessoas chega, chegam também atrás de comida, os moradores de rua. Na pça do Carmo, os vemos fazer todas as necessidades físicas humanas, inclusive sexo em cima dos bancos ou nas calçadas.  Os comerciantes se lamentam que estão perdendo os clientes e contam fatos de roubos, assaltos, quebra de espelhos e vidros dos carros, etc. As missas da manhã, foram eliminadas, e as da tarde se resumem, hoje,  a uma so.

Algo mais a dizer: a vocação do comércio da CV é voltada aos ribeirinhos. Aqui se encontram lojas de material de construção, de navegação, bombas de agua, remos, velas, redes de pesca, barcos de madeira, de alumínio e de fibra de vidro!!! etc.  Fazem consertos também de maquinas de açaí e de motores de barco. Coisas desse tipo. O resto: sapato, vestido, etc. eles vão no comercio procurar.

Feita essa premissa toda, é o caso de lembrar que, as leis falam de salvaguarda da nossa memória histórica. Um projeto de tutela do Patrimônio Histórico deveria ser feito onde fossem individuadas as ações necessárias a sua valorização para assegurar a salvaguarda do territorio em questão. Pesquisar a qualidade do ambiente historico e sua correta fruição coletiva.

Se assim é, seria ridículo fechar essas lojas que ficam na Siqueira Mendes e dão para o rio, para substitui-las com bares  e restaurantes para  turistas.... e, quem sabe, até depois pintar tudo com cores fortes assim apagamos definitivamente a nossa memoria... a daqueles avós  que ainda  lembram quando tudo era pintado com cores claras.

Para encerrar: nenhuma lei proíbe o embelezamento da área tombada, proíbe, porém, a mudança do nosso passado, das lembranças que devemos salvaguardar, portanto, até a grafitagem não devia encontrar lugar na área tombada....e o muro do forte do Castelo devia ter permanecido ali... no seu lugar.

 Essa é a nossa colaboração, como prevê a Constituição.

VAMOS PENSAR NISSO?


Dulce Rosa de Bacelar Rocque

Um comentário:

  1. Cara Dulce, te felicito tremendamente pela iniciativa! És praticamente a única a lutar por essa causa. A única a se preocupar a ponto de tomar iniciativas concretas em defesa de nosso patrimônio, sobretudo daquele presente no nosso bairro mais antigo.

    NO caso das ruas e calçadas, nunca aceitei o asfaltamento. Passar asfalto sobre o piso histórico de granito é esconder nossa memória e enfeiar a CV. Foi mais uma política em nome da modernidade, desrespeitando a história e identidade local.

    Recuperar o piso de paralelepípedo e as calçadas de lioz é o 1º passo mais simples para restaurar o valor do bairro.

    Quanto à Siqueira Mendes, pode haver uma solução intermediária. Alguns imóveis ali parecem abandonados. Serviços de hoteis, cafés ou restaurantes podiam conviver com as lojas. Em outros lugares do mundo é assim. Não é necessário expulsar as lojas que atendem os ribeirinhos.

    Outra ideia é construir um porto público (terminal hidroviário de médio/pequeno porte) nas cercanias do Carmo,ou Porto do Sal. Manteríamos o fluxo ribeirinho na área, mas muito mais organizado, porque concentrado num único ponto. Aí talvez fosse possível usar alguns imóveis na S. Mendes para outros fins sem prejudicar o transporte da população.

    São apenas algumas ideias. Penso que devemos começar pelo básico: restaurar o calçamento de ruas e passeio público, rever a rede coletora de esgoto e águas pluviais, organizar o transito. Em seguida, podemos iniciar planos mais ousados.

    Grande abraço e boa sorte, sempre!!!

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