A
historiografia brasileira sempre achou que os povos “índios” não merecessem
fazer parte da nossa história, mas somente da Etnografia... consequentemente, a
história do Brasil começa na Europa e os autóctones aparecem somente no século
XVI para desaparecerem logo após.
No século
XIX foram repescados por uma literatura que, de modo ambíguo, reforçava a ótica
europeia. Para Gonçalves Dias, José de Alencar e até mesmo Carlos Gomes, o
indígena tinha a cabeça do colonizador: era considerado aliado dos portugueses,
o que não era verdade.
Salvo
raríssimas exceções à população local não foi permitido deixar traços ou sinais
da própria cultura. A influência da própria língua aparece somente na geografia
dando nome a sitos naturais e a cidades
e rios. Na Amazônia encontramos um pouco mais nas comidas, também.
O interesse
pelo “pau Brasil” encontrado no litoral
aumentava o risco de serem escravizados, o que os levou a se afastarem cada vez
mais dessa área e dos “civilizadores”. Até a primeira Constituição brasileira os ignorou, correção feita com o
Ato Institucional de 1834, onde ficou estabelecido que a Assembleia das Províncias
devia reunir os índios em colônias ... afim de facilitar a catequese e de
consequência, também, a apropriação, indevida, de suas terras.
Em 1961,
depois de uma longa luta para salvar o salvável, nasce o Parque Indígena do
Xingu para onde levaram os 5000 sobreviventes, encontrados então, e
representando 17 nações indígenas diferentes.
Passam assim a viver em “reservas” nem sempre delimitadas, ou respeitadas e,
mais uma vez, tutelados por um governo historicamente hostil a sua
sobrevivência.
Em 1967 nasce
a FUNAI, para coordenar a política indigenista nacional, para cuidar do seu
patrimônio, proteger as suas terras e promover a assistência médica. Essa politica
integracionista acabou negando suas diferenças culturais e históricas e só teve
fim com a Constituição de 1988.
Em 1990, no
sul do Pará, numa área de 3,3 milhões de hectares, viviam cerca de 3.550 indígenas do grupo Kaiapó, sobrevivendo
das riquezas existentes ali. Depois da descoberta de ouro naquela área,
aumentou o comercio inclusive de mogno e
óleo de castanha do Pará e seus costumes são alterados, mais uma vez. O
contato com o mundo externo aumenta, e eles descobrem a sociedade de consumo.
Inicia uma “expansão capitalista” e sobretudo uma revolução nos seus costumes
de vida começando com o abandono do cultivo da terra.
Com a
introdução dos bens de consumo e de novas tecnologias nas aldeias, os Kaiapós
permitem também a infiltração daquelas culturas que tinham evitado por séculos.
Aprendem a usar o rádio e se comunicar
com os outros grupos indígenas do Parque do Xingú; com o registrador cobravam
as promessas feitas pelos políticos; com um avião controlavam que mineradores
abusivos não roubassem ouro no território deles.
O medo de perder a própria identidade inicia a
ser combatida por eles com os meios que os brancos ensinaram a usar. Nus, as vezes até com os
corpos pintados, saiam com uma tele câmera a tiracolo, registrando tudo,
conscientes que a própria cultura era o
elemento principal da identidade comunitária. Entenderam que aquele
conteúdo era um recurso politico para
conquistar aliados não indígenas.
As imagens
dos índios com alta tecnologia girou o mundo. Aproveitaram para protestar contra o estado brasileiro e até o
Time publicou a denúncia relativa a construção de uma central hidroelétrica que
inundaria suas terras... Quando o antropólogo Terence Turner viu o trabalho
feito pela comunidade indígena se perguntou: Como essa gente que consideramos inferior e subdesenvolvida, fez esse
trabalho¿ Será que não avaliamos bem a inteligência deles¿ Essa ação abriu
os olhos dos movimentos de defesa dos direitos humanos e dos ambientalistas,
fortalecendo as ligações com as tribos.
É o
tempo que, Raoni conquista o auxílio
internacional do cantor Sting, que levou a criação de organizações não
governamentais de proteção à floresta e aos Kayapó, como a Rainforest
Foundation e sua filial brasileira Fundação Mata Virgem (Rabben, 1998).
As
negociações com as autoridades, a aliança com vários movimentos e as
manifestações feitas em várias cidades tiveram cobertura da mídia. Além de
fortalecer os próprios valores culturais, com os vídeos, chamaram atenção do
mundo todo...
Hoje, a distancia de mais de 20 anos: o que aconteceu que a apropriação cultural e politica dessa nova tecnologia, não se propagou e agora estamos descobrindo o que fizeram os “colonizadores” na Amazônia inteira... Como entraram e prosperaram os "cercadores de ouro" nessas áreas? A riqueza dos Kaiapós que fim levou? Os Yanomamis, em que situação estão? E as outras etnias? Quem permitiu o avanço de tanta desgraça?
No penúltimo censo o IBGE registrou quase 900 mil indígenas no país. Hoje, qual a participação das várias etnias no total da população brasileira?
Os atuais "politicos" indigenas terão muito o que fazer ...
Para mudar o avançar dessa história, a preservação é necessária, porém, dentro e fora dos territórios indígenas...
PS. Parte desse artigo foi publicado na Italia, em setembro de 2002, na revista Mundo Brasil.
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