quinta-feira, 28 de agosto de 2025

VÃO REABRIR A TRAV. JOAQUIM TAVORA (3)

SENTENÇA relativa a AÇÃO POPULAR

Número: Proc. n º.0831545-29.2021.8.14.0301

Tribunal de Justiça do Estado do Pará - 1º Grau PJe - Processo Judicial Eletrônico

Autor: Tiburcio Barros do Nascimento

Réus: Incogel Indústria e Comércio de Gelo e Pescado Ltda. e Município de Belém

Classe: AÇÃO POPULAR

Órgão julgador: 5ª Vara da Fazenda Pública dos Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos da Capital


3 – Dispositivo

 Ante o exposto, julgo parcialmente procedente o pedido formulado na petição de ingresso em face de Incogel Indústria e Comércio de Gelo e Pescado Ltda. e do Município de Belém, para:

1.  Condeno a ré Incogel Indústria e Comércio de Gelo e Pescado Ltda. na obrigação de fazer consistente na retirada integral do portão e de quaisquer outras construções ou obstáculos que impeçam o livre e desimpedido acesso à Rua Joaquim Távora e, por conseguinte, à Baía do Guajará, no prazo de 60 (sessenta) dias, a contar da intimação desta sentença, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 (mil reais), limitada, inicialmente, a R$ 100.000,00 (cem mil reais), sem prejuízo de ulterior majoração ou imposição de outras medidas coercitivas e de apoio que se façam necessárias para o cumprimento da determinação judicial.

2. Condeno o réu Município de Belém na obrigação de fazer consistente em adotar todas as medidas necessárias e efetivas para garantir a plena fruição pública da Rua Joaquim Távora.     

     Julgo improcedente o pedido de condenação do réu Município de Belém na obrigação de fazer consistente na elaboração e execução de projeto de urbanização e construção de estruturas de acesso à Baía do Guajará, como um trapiche e/ou mirante na Rua Joaquim Távora.     

      Deferir a gratuidade processual ao autor popular, nos termos do art. 18 da Lei nº 4.717/65, isentando-o do pagamento de custas processuais e do ônus da sucumbência.

Custas processuais em face da ré Incogel Industria e Comercio de Gelo e Pescado Ltda.

Condeno-os, os réus solidariamente, ao pagamento de dos honorários advocatícios em fav or do autor, que fixo por apreciação equitativa, considerando o trabalho desenvolvido e a complexidade da causa, que fixo em 1.000,00 (um mil reais).  

3. Os réus arcarão com seus próprios honorários advocatícios, vedada a compensação, nos termos do art. 85, § 14, do CPC.   

 Intimar e cumprir.

                          Belém, 26 de agosto de 2025

                          RACHEL ROCHA MESQUITA

                          Juiza Auxiliar de 3ª Entrância

 respondendo pela 5ª Vara da Fazenda Pública e Tutelas Coletivas

 

XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX

É o caso de lembrar que a ação popular é um meio judicial que 

permite a qualquer cidadão brasileiro impugnar atos que lesem o

patrimônio público, a moralidade administrativa, o meio ambiente

 e o patrimônio histórico e cultural.

Esta sentença está nos autos do processo e pode ser consultada 
diretamente no PJE com o número acima, que consta no documento.




VÃO REABRIR A TRAV. JOAQUIM TAVORA (2)

 CONTINUAÇÃO DA SETENÇA RELATIVA AO PROCESSO 0831545-29.2021.8.14.0301 (TRAV. JOAQUIM TÁVORA)

2 – Fundamentos 

A presente ação popular demanda uma análise aprofundada dos princípios do Direito Administrativo, da proteção ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, bem como dos direitos fundamentais à cidade e à fruição dos bens de uso comum do povo. 

A controvérsia central reside na legalidade da instalação de um portão pela empresa Incogel na Rua Joaquim Távora, no Município de Belém, e na omissão do poder público municipal em garantir o livre acesso à via e ao rio, ao qual ela se articula. 

2. 1. Preliminares 

2.1.1 Ilegitimidade ativa e passiva e da adequação da via eleita A preliminar de inadequação da via eleita, arguida pelo Município de Belém, não merece acolhimento. A Ação Popular, prevista no Art. 5º, inciso LXXIII, da Constituição Federal, e regulamentada pela Lei nº 4.717/65, tem como objetivo principal a defesa do patrimônio público, da moralidade administrativa, do meio ambiente e do patrimônio histórico e cultural contra atos lesivos. A interpretação de "ato lesivo" deve ser ampla, compreendendo tanto as condutas comissivas quanto as omissivas do Poder Público ou de particulares. 

No caso em tela, a conduta da Incogel de instalar e manter um portão que obstrui a Rua Joaquim Távora configura um ato comissivo lesivo ao patrimônio público e ao meio ambiente, pois impede a livre circulação e o acesso à Baía do Guajará, um bem natural de uso comum do povo. 

Paralelamente, a inércia do Município de Belém, ao longo dos anos, em remover tal obstrução e garantir a fruição plena da via pública, caracteriza uma omissão lesiva à moralidade administrativa e ao próprio patrimônio público que lhe compete zelar. 

A restrição da ação popular apenas à anulação de atos, como pretendido pelo município, esvaziaria o seu alcance protetivo em face de situações onde a lesão se manifesta pela inação ou pela conduta contínua de particulares ou do próprio poder público. Portanto, a via eleita pelo autor é perfeitamente adequada para a defesa do interesse público envolvido, buscando não apenas a remoção de uma obstrução, mas a efetiva garantia de um direito coletivo à cidade e ao meio ambiente. 

A legitimidade ativa do autor, como cidadão eleitor (conforme documentos de ID 27777829), é inquestionável para propor ação popular. Quanto à legitimidade passiva, a Incogel é parte legítima por ser a responsável pela instalação e manutenção do portão, configurando o ato lesivo. O Município de Belém, por sua vez, é parte legítima por sua omissão no dever de fiscalização, proteção do patrimônio público e garantia do direito de ir e vir dos cidadãos, conforme reiteradamente apontado pelo Ministério Público. 

2.1.2. Prescrição 

A preliminar de prescrição, arguida pela Incogel, também não prospera. Os bens públicos, por sua natureza jurídica e pela sua essencialidade ao interesse coletivo, são imprescritíveis. Um logradouro público, como a Rua Joaquim Távora, classificado como bem de uso comum do povo, não está sujeito à usucapião, conforme o teor pacífico da Súmula 340 do Supremo Tribunal Federal, que estabelece: "Desde a vigência do Código Civil, os bens dominicais, como os demais bens públicos, não podem ser adquiridos por usucapião.". Embora a súmula mencione bens dominicais, o entendimento se estende, com ainda maior razão, aos bens de uso comum do povo, os quais são intrinsecamente afetados a uma finalidade pública e coletiva, sendo, portanto, inalienáveis e imprescritíveis. 

A ocupação de um bem público por particular, ainda que por longo período, como alegado pela Incogel desde 1968, jamais convalida a situação de ilegalidade, tampouco gera qualquer direito de posse oponível à Administração Pública ou à coletividade. 

A possibilidade de reaver o bem público e cessar a lesão a a ele perpetrada é um direito que acompanha a imprescritibilidade do próprio bem. O fato de ter havido uma judicialização anterior em 1993, com extinção sem julgamento de mérito, como afirmado pela própria Incogel, não tem o condão de legitimar a ocupação nem de fazer fluir prazo prescricional para a defesa do bem público, uma vez que a questão de fundo – a ilegalidade da apropriação – nunca foi definitivamente resolvida em juízo. A lesão ao patrimônio público é uma situação continuada, que se protrai no tempo enquanto a obstrução permanecer.

Ademais, a Lei nº 4.717/65, em seu Art. 21, estabelece o prazo prescricional de cinco anos para a propositura da ação popular, contado da data da publicação oficial do ato lesivo. No presente caso, a lesão não decorre de um ato formalmente publicado, mas de uma situação de fato de ocupação irregular de um bem público, que se protrai no tempo e se renova diariamente, mantendo a agressão ao interesse coletivo. Em tais circunstâncias, o prazo prescricional não se inicia enquanto persistir a lesão. Portanto, rejeita-se a preliminar de prescrição. 

2.1.3 Mérito da Pretensão

A controvérsia de mérito impõe a análise da natureza da Rua Joaquim Távora, da legalidade da ocupação por particular e do impacto dessa ocupação nos direitos fundamentais da coletividade ao meio ambiente e ao patrimônio histórico-cultural. 

A Rua Joaquim Távora é, inequivocamente, um bem público de uso comum do povo, nos termos do Art. 99, inciso I, do Código Civil. Logradouros públicos, como ruas, praças e vias, são bens de domínio público destinados à livre circulação de pessoas e veículos, à qual se atribui uma finalidade de uso geral e irrestrito pela coletividade. Sua utilização é livre para todos, e sua destinação fundamental é servir ao interesse público. 

O contexto histórico da cidade de Belém, conforme amplamente detalhado pelo Ministério Público em sua manifestação, demonstra que as primeiras ruas da Cidade Velha, onde se insere a Rua Joaquim Távora (originalmente conhecida como "Caminho do Atalaya"), foram traçadas e desenvolvidas a partir do Rio Guamá/Baía do Guajará. Essa característica ribeirinha é intrínseca à identidade de Belém, e as vias que se projetam até as margens dos rios e baías são fundamentais para a vivência da cidade e sua relação com o ambiente natural e cultural. 

Os mapas e levantamentos aerofotogramétricos da Companhia de Desenvolvimento Urbano de Belém (CODEM) e da Secretaria Municipal de Urbanismo (SEURB), especialmente o levantamento de 1978 e 2014 (IDs 75360324 e 104202372), confirmam o traçado original da Rua Joaquim Távora com continuidade até a Baía do Guajará. 

Embora o município, em sua petição de ID 104202387, tenha se limitado a juntar os documentos sem maiores análises conclusivas, o próprio mapa da CODEM (ID 104202372) não apresenta " indicativos de construção de portão na esquina" no levantamento de 2014, o que corrobora a natureza pública da via em sua totalidade. 

A imagem de satélite do Google Maps (ID 75360323), e as análises do Ministério Público (ID 109339045), reforçam visualmente a existência da continuidade da via além do ponto onde o portão foi instalado. Os depoimentos de moradores históricos, como a Sra. Dulce Rocque e a Profa. Maria de Belém Menezes, coletados e citados pelo Ministério Público (ID 109339045), atestam que a Rua Joaquim Távora, também conhecida em seu trecho final como "Beco do Cardoso", sempre foi um local de livre acesso à beira do rio, utilizado pela comunidade para diversas atividades e como ponto de conexão vital com a vida ribeirinha.

Essa memória coletiva é um componente inestimável do patrimônio imaterial da cidade, diretamente afetado pela obstrução. 

Diante de tal conjunto probatório e contextual, é indubitável que a Rua Joaquim Távora, em toda a sua extensão, até as margens da Baía do Guajará, possui natureza de bem público de uso comum do povo.

 A Lei Ordinária Municipal nº 9.353, que dispõe expressamente sobre a instalação de portão, cancela, correntes ou similares na entrada de vilas, ruas e/ou qualquer via denominada 'rua sem saída’, estabelece em seu 

          "Art. 1º Fica permitida a instalação de portão, cancela, correntes ou similares                       na entrada de vilas, ruas e/ou qualquer via que se articula em uma de suas                             extremidades e cujo traçado original não tem continuidade com a malha viária da                 outra extremidade, denominadas “ruas sem saída”." 

A condição essencial para a permissão de instalação de portões, conforme a referida lei municipal, é que a via seja caracterizada como "rua sem saída", ou seja, cujo traçado original não tenha continuidade com a malha viária na outra extremidade. 

No presente caso, a Rua Joaquim Távora, como demonstrado pelos elementos históricos e cartográficos, termina no rio, não constituindo uma rua sem saída nos termos técnicos e legais da Lei nº 9.353. 

Uma rua que se articula com um rio tem continuidade por meio aquático, sendo uma característica marcante da urbanização ribeirinha de Belém, e não se encerra em si mesma sem conexão alguma. 

Portanto, a colocação de um portão nesta via não se enquadra na exceção legal e, consequentemente, é ilegal por ausência de autorização formal e por contrariar o disposto na própria legislação municipal que regularia tais casos. 

Ademais, a própria Incogel, em sua contestação (ID 37310477), menciona que foi "incomodada pela PMB através da Secretaria Municipal de Urbanismo alegando que parte das instalações da empresa acham se situada na 'projeção da Rua Joaquim Távora' impedindo o acesso do público" e que foram expedidas notificações e até um "AUTO DE DEMOLIÇÃO" em 1997 para a retirada do portão. 

Embora a empresa alegue ter obtido uma medida cautelar judicial para vedar o procedimento naquela época, a existência dessas ações por parte da prefeitura, ainda que frustradas no passado, demonstra que o próprio ente municipal reconheceu a ilegalidade da obstrução, ao menos em determinados períodos. 

A atual postura do município, que tenta justificar a inação, não se coaduna com a defesa do interesse público e com o histórico de intervenções fiscais sobre a área. A ausência de um registro formal de autorização da Prefeitura de Belém para a colocação do portão pela ré Incogel,conforme expressamente delineado na instrução do usuário, é um fato incontroverso nos autos, reforçando a ilegalidade da medida. 

A Incogel fundamenta parte de sua defesa na condição de foreira da União em "terreno de marinha" e na posse de autorizações de órgãos federais e estaduais para suas instalações. Contudo, é fundamental distinguir o direito de aforamento sobre um terreno de marinha do direito de obstruir uma via pública. O aforamento confere ao particular o direito de uso precário sobre o bem da União, mediante o pagamento de laudêmio e foro, mas não transfere a propriedade plena do imóvel, tampouco lhe confere prerrogativa de suprimir logradouros públicos adjacentes. 

A autorização concedida pela SPU para ocupação de terreno de marinha pela Incogel diz respeito à área concedida sob aforamento, não se estendendo, por óbvio, à via pública que, como bem de uso comum do povo, tem destinação pública inalterável por ato de aforamento de terceiro. 

A própria resposta da Delegacia do Patrimônio da União no Pará, citada pela Incogel em sua contestação (Ofício nº 063/93 DPU PA – ID 37310477), menciona que "Não há projeto urbanístico da Prefeitura Municipal de Belém na área, aqui registrado, em solicitação de cessão da DPU para implantação qualquer de interesse público". 

Essa informação, longe de beneficiar a Incogel, reforça a ausência de um plano urbanístico municipal que justificasse a alteração da via e, implicitamente, a ilegalidade da obstrução. 

Quanto à tese da aluvião, levantada pela Incogel e abordada pelo Ministério Público, ainda que houvesse acréscimo de terras na margem do rio (seja por processo natural ou artificial), tal fenômeno não alteraria a natureza pública da Rua Joaquim Távora. A via pública, como "principal", mantém sua integridade e destinação até o curso d'água, e os acréscimos de terra se incorporam ao domínio público daquela área, jamais ao particular que a ocupa, em respeito ao princípio de que o acessório segue o principal e à vedação do enriquecimento sem causa em detrimento do patrimônio público. 

A legislação civil, em seu Art. 1.250, estabelece que os acréscimos formados ao longo das margens das correntes pertencem aos donos dos terrenos marginais; contudo, quando a "terreno marginal" é uma via pública, este acréscimo também se incorpora ao domínio público, em benefício da coletividade.

A tentativa de apropriação de tal área pelo particular para fins privados, mesmo que com investimento em aterramento, configura uma conduta abusiva e ilícita. 

A apropriação de um logradouro público como a Rua Joaquim Távora, com a instalação de um portão que impede o acesso à Baía do Guajará, representa uma grave violação a preceitos constitucionais e legais que protegem o meio ambiente e o patrimônio histórico e cultural. 

O Art. 225 da Constituição Federal assegura a todos o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida.

O acesso a ambientes naturais, como a beira de um rio, é fundamental para o bem-estar, a saúde mental e o lazer da população. A obstrução da Rua Joaquim Távora impede essa fruição, privando os cidadãos de Belém do contato com a natureza e de uma vista deslumbrante que, segundo os relatos históricos, sempre foi parte integrante da experiência urbana daquela região. A dimensão ambiental da lesão é clara e direta. 

Paralelamente, a Rua Joaquim Távora, como parte integrante do bairro mais antigo da cidade, a Cidade Velha, possui um valor histórico e cultural inestimável. Ela é um testemunho da própria gênese de Belém, uma cidade que nasceu e se desenvolveu em estreita relação com seus rios e a baía. A memória coletiva dos moradores que brincavam, pescavam e contemplavam a paisagem a partir dessa via pública constitui um patrimônio imaterial que é violentado pela privatização do espaço. 

O portão de aço, além de ser uma barreira física, simboliza a exclusão e o desrespeito a essa rica herança histórica e cultural. A omissão do Município de Belém, ao longo dos anos, em agir de forma eficaz para desobstruir a via, apesar de ter sido notificado e ter tentado agir em momentos anteriores, configura uma falha grave em seu dever de proteger o patrimônio público, o meio ambiente e a memória da cidade, conforme exigido pela Constituição Federal e pelas leis urbanísticas. 

A inação do poder público municipal, neste caso, não pode ser justificada sob o manto da discricionariedade administrativa ou da reserva do possível, pois a proteção desses bens transcende a mera conveniência e oportunidade, constituindo um dever fundamental e inescusável. 

A discricionariedade do administrador público deve pautar-se sempre pela legalidade e pelos princípios que regem a Administração Pública, como a moralidade, a impessoalidade e a eficiência, todos violados pela manutenção de uma situação de flagrante ilegalidade em detrimento do  interesse público. 

Em síntese, a conduta da Incogel em obstruir a Rua Joaquim Távora e a omissão do Município em garantir o livre acesso à Baía do Guajará são atos lesivos ao patrimônio público material e imaterial, ao meio ambiente e ao direito fundamental à cidade, justificando a procedência da Ação Popular.


SEGUE

quarta-feira, 27 de agosto de 2025

VÃO REABRIR A TRAV. JOAQUIM TAVORA (1)

 É COM IMENSA SATISFAÇÃO QUE PUBLICAMOS PARTE  DA SETENÇA RELATIVA AO PROCESSO 0831545-29.2021.8.14.0301 

PROMOVIDO POR TIBURCIO BARROS DO NASCIMENTO (AUTOR) 

CONTRA INCOGEL INDUSTRIA E COMERCIO DE GELO E PESCADO LTDA (REU) E MUNICIPIO DE BELÉM (REU)

PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ 5ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA E TUTELAS COLETIVAS 

SENTENÇA 1 – Relatório Trata-se de ação popular ajuizada por Tiburcio Barros do Nascimento, devidamente qualificado nos autos, em face da Incogel Indústria e Comércio de Gelo e Pescado Ltda. e do Município de Belém.

 Na petição inicial, o autor narrou que a Rua Joaquim Távora, situada no histórico bairro da Cidade Velha, em Belém/PA, teve seu acesso indevidamente fechado pela empresa Incogel, com a colocação de um portão de ferro, configurando um ato que considerou "ilegal, imoral e irracional" (sic). 

Destacou a importância histórica e cultural da via, sua conexão direta com a Baía do Guajará e a tradicional utilização pelos moradores e pela população em geral para lazer e contemplação. 

Sustentou que, a apropriação de um bem de uso comum do povo por um particular, sem autorização legítima do poder público, violenta o direito de ir e vir, o meio ambiente ecologicamente equilibrado, e o patrimônio histórico e cultural da cidade e do país, além de representar um enriquecimento ilícito do particular em detrimento do patrimônio público. 

Argumentou, ainda, que a impossibilidade de fruição de espaços abertos, como a rua em questão, assume particular relevância em contextos de saúde pública, como o da pandemia, reforçando a necessidade de ambientes que promovam a saúde mental e o bem-estar. 

Em sua emenda à inicial (ID 27971399), o autor explicitou os pedidos para que "Seja derrubado o portão de ferro, a fim de que, todos tenham livre acesso a rua Joaquim Távora e a construção de um trapiche e um mirante pela Prefeitura de Belém para a utilização dos ribeirinhos e demais cidadãos que frequentem o local". 

O pedido de tutela foi apreciado e indeferido conforme consta da decisão inserida no ID 52987990. 

Regularmente citado e intimado, o Município de Belém apresentou manifestação preliminar (ID 30888579) e, posteriormente, contestação (ID 60376896). 

Em ambos os atos processuais, o município arguiu, preliminarmente, a inadequação da via eleita. Sustentou que a ação popular, nos termos da Lei nº 4.717/65, destina-se à anulação de atos lesivos ao patrimônio público, não sendo instrumento processual hábil para postular obrigações de fazer ou não fazer. 

No mérito, o município alegou que a pretensão do autor configuraria indevida interferência do Poder Judiciário na gestão da coisa pública, uma vez que a possibilidade de fechamento de via pública por particular integra o mérito administrativo e não pode, por si só, implicar ilegalidade. 

Argumentou que, a Constituição Federal estabelece a separação de poderes, vedando a interferência do Judiciário em questões de conveniência e oportunidade do Executivo, salvo ilegalidade, que, em sua visão, não foi apontada. 

Acresceu que, a competência para o ordenamento territorial urbano é exclusiva do administrador municipal e que o provimento judicial pleiteado invadiria essa seara. Afirmou por fim que, a inicial não indicou prejuízo real à sociedade e que a realização de obras depende de dotação orçamentária, invocando o princípio da reserva do possível, também com precedentes jurisprudenciais. 

Requereu a improcedência da ação.

 A Incogel Indústria e Comércio de Gelo e Pescado Ltda., por sua vez, apresentou contestação (ID 37310477). Preliminarmente, arguiu a prescrição da pretensão, alegando que a situação já fora objeto de judicialização em 1993, com pleno conhecimento do município e do Ministério Público há mais de 50 anos, e que a ação popular seria inadequada para questionar matéria já apreciada. 

Mencionou o julgamento do EREsp 1.321.501 SE do STJ sobre a prescrição quinquenal para ações civis públicas.

 No mérito, a Incogel defendeu a regularidade de sua ocupação, afirmando que a área onde se encontra instalada é um terreno de marinha, situado à beira da Baía do Guajará, e que a ocupa como foreira desde 1968, após regular processo de aforamento junto ao Serviço de Patrimônio da União (SPU).

 Apresentou vasta documentação (ID 37310478 a ID 37312902) para demonstrar que suas instalações e o trapiche foram construídos mediante licenças e aprovações de diversos órgãos competentes, como SPU, DNPVN (Departamento Nacional de Portos e Vias Navegáveis), CDP (Companhia das Docas do Pará) e Capitania dos Portos. 

Sustentou que, "não existe rua que vá até as margens da Baía do Guajará, a rua termina na praça", e que a área contestada seria parte de suas instalações, integrando seu patrimônio privado. Afirmou que, o Ministério Público do Estado já apurou a legitimidade e regularidade das instalações em 1993 (ID 37310477).

Concluiu que, a simples retirada do portão não possibilitaria o acesso à vista da baía, pois a área estaria toda edificada, não permitindo sequer a visualização das águas. 

O autor apresentou réplicas às contestações (ID 56658140 e ID 64508858), refutando os argumentos dos réus. Reiterou que, não há atividade econômica na empresa que justifique a restrição do uso público da rua, e que o suposto uso fruto está vinculado à função social, não à ociosidade. 

Enfatizou que a Rua Joaquim Távora existia antes da empresa e que o Código Civil e a Súmula 340 do STF proíbem a usucapião contra o Poder Público, especialmente em bens de uso comum do povo. 

Aduziu que, a lei municipal autoriza portões apenas em ruas sem saída, o que não se aplica ao caso. 

O Ministério Público do Estado do Pará, na qualidade de fiscal da lei, apresentou detalhadas manifestações (ID 75360320 e ID 109339045). 

O Parquet rechaçou veementemente as preliminares e os argumentos de mérito levantados pelos réus. Quanto à inadequação da via eleita, o Ministério Público afirmou que a ação popular é, sim, instrumento adequado para combater atos lesivos, sejam eles comissivos (como a apropriação da via pela Incogel) ou omissivos (como a inércia municipal na fiscalização e defesa do bem público). Reforçou a amplitude da palavra "ato" nesse contexto, compreendendo condutas positivas e negativas. 

Sobre o alegado mérito administrativo e a ausência de ato lesivo por parte do Município, o Ministério Público apontou contradição na postura municipal, destacando que a própria Incogel mencionou em sua contestação notificações da prefeitura para a retirada do portão, o que indicaria que o município, em outros momentos, reconheceu a ilegalidade da ocupação. 

Argumentou que, a ausência de um plano urbanístico não pode justificar a ocupação indevida de uma via pública. 

O Ministério Público solicitou tendo sido deferido por este juízo, a requisição ao Município de Belém para levantamento aerofotogramétrico da área para elucidação dos fatos (ID 100890178). 

A municipalidade, juntou os documentos da CODEM e SEURB (ID 104202372 e ID 104202382), informando que "a Rua Siqueira Mendes com a Travessa Joaquim Tavóra pelo último levantamento aerofotogramétrico em 2014, não há indicativos de construção de portão na esquina". 

O Ministério Público, em manifestação complementar (ID 109339045), analisou os documentos e os rechaçou, asseverando que o próprio documento da SEURB demonstra que a área em debate é, de fato, a continuação da via pública Joaquim Távora (destacada em verde no mapa), que, a partir do último quarteirão, é denominada "Beco do Cardoso" (destacada em vermelho no mapa), confirmando a usurpação da área pública. 

O Parquet aprofundou a análise histórica de Belém, apresentando informações sobre a origem da cidade e a formação das ruas da Cidade Velha, a partir do rio, com a Rua Joaquim Távora sendo originalmente o "Caminho do Atalaya", que tinha acesso direto à baía. 

Citou depoimentos de moradores históricos para demonstrar que o acesso ao rio sempre existiu e era utilizado pela população, sendo a obstrução um fato recente e le...sivo à memória e cultura locais. 

Adicionalmente, o Ministério Público utilizou imagens do Google Maps para evidenciar a situação atual da via, com o portão da Incogel obstruindo o acesso, e indicou a possibilidade de aluvião na área. Contudo, argumentou que, mesmo com aterramento, o direito pátrio não protege a apropriação, pois o acessório (aterro) segue o principal (a via pública original), e que tal ação configuraria enriquecimento sem causa. 

O autor popular, em sua última manifestação (ID 111100516), ratificou as provas e argumentos, reforçando que o portão de ferro impede a vista e o acesso da população ao rio, que é um direito histórico e cultural.

O processo foi saneado (ID 137903971), sendo reconhecida a desnecessidade de produção de outras provas, dadas as provas documentais já acostadas e a suficiência do conjunto probatório para o julgamento da lide. 

É O RELATORIO

SEGUE ...

sexta-feira, 8 de agosto de 2025

FELIX ANTONIO ROCQUE


DOMINGO É DIA DOS PAIS e dia 08/08/1959 morria Felix Antonio Rocque: mas quem foi essa pessoa que virou nome de rua?

JOSÉ VALENTE, no livro A História das Ruas de Belém – Cidade Velha, ed. CEJUP, 1003, págs. 21/24,nos conta algo a respeito dele.

Em homenagem ao dia dos Pais, aqui vai essa lembrança.

 (Foi meu pai... mas eu fui criada por minha mãe e minha avó materna que hoje seriam chamadas de "pães". Não tenho nenhuma lembrança de meu pai em casa, isso porém não tira seu direito de Pai....e do que ele fez na sua vida a ponto de virar nome de rua... longe dos filhos da sua segunda mulher, ou seja, da minha mãe.)


“Felix Rocque, que nasceu menino pobre em Belém a 15 de Agosto de 1908, com sacrifício concluiu o curso primário, ao mesmo tempo em que exercia a profissão de balconista.
(Uma correção: ele nasceu no navio que trouxe seus pais do Libano, enquanto esperavam o técnico da barra, que devia trazer o navio para o porto de Belém).
Não chegou a concluir o curso ginasial.
Felix foi um condoreiro, tal o arrojo de suas idéias. Nos anos trinta o jogo era legalizado e, assim sendo, Felix obteve a concessão para explora-lo.
No Grande Hotel – ali na praça da República – instalou o seu Palácio Cassino nos moldes do da Urca, Atlântico e Quitandinha. Enquanto ali se praticava a tavolagem, assistia-se a esmerados espetáculos musicais.
Mas, foi na parte profana da Festa de Nossa Senhora de Nazaré que Felix Rocque empolgou
Nos terrenos baldios (bons tempos) no largo de Nazaré (praça Justo Chermont), onde hoje estão localizados um banco e a vila Leopoldina, Felix construía os seus teatros descartáveis – terminada a quadra nazarena eles eram desmontados – onde a fina flor do rádio carioca e paulista se apresentava.
Durante 20 anos, Felix Rocque foi o imperador dos espetáculos musicais e teatrais da quinzena nazarena, e mesmo depois de ter perdido a concessão do jogo para João Baltazar, continuou insuperável na apresentação de seus espetáculos.
Inquestionavelmente, a parte profana da Festa de Nazaré foi enterrada com o seu criador no dia 8 de agosto de 1959, data da morte de Felix Rocque.
Foi através do projeto de lei do vereador Amado Magno e Silva que a Câmara de Vereadores de Belém, sob a presidência do edil Olavo Nunes, aprovou, poe unanimidade, a troca do nome da rua da Vigia para Felix Rocque.
Corria o ano de 1960
A rua Felix Rocque foi a quinta rua aberta em Belém e isso há muito tempo.

https://civviva-cidadevelha-cidadeviva.blogspot.com/2022/08/felix-rocque.html



 

terça-feira, 5 de agosto de 2025

UMA LEI FASCISTA... e nós?

 

 Mussolini começou a preparar a estrada para institucionalizar o fascismo na Italia através de  leis. Com a  Lei nº 100 (31 de janeiro de 1926) estabeleceu que o “ governo tem o direito de fazer regulamentações legais...”

A partir dessa lei “o poder executivo passa a ter o poder de ditar normas jurídicas por meio de decretos, sem a necessidade de intervenção das assembleias legislativas." Entre nós nem foi preciso fazer uma lei, simplesmente todos ignoram desde a Constituição, tranquilamente.

Pessoas que  nunca estudaram Direito, abusam nas secretarias, dando maus exemplos, o que vemos inclusive entre aqueles quem se vangloriam de ser Master ou PHD... sem nunca ter lido ao menos o Código de Postura.

Governar sem respeitar as leis, não  é democracia... e vemos isso em vários atos que são publicados sem nenhum confronto.. nem ao menos com a cidadania. Vemos artigos de  leis declaradas inconstitucionais que continuam a serem usadas.

https://civviva-cidadevelha-cidadeviva.blogspot.com/2023/12/inconstitucionalidade-da-lei-79902000.html

Outro exemplo são as orientações dadas pelo Ministerio Público e ignoradas... - https://civviva-cidadevelha-cidadeviva.blogspot.com/2016/02/as-calcadas-segundo-o-mpe.html

As calçadas não as ignoramos, outros sim...

- https://civviva-cidadevelha-cidadeviva.blogspot.com/2020/09/atencao-as-calcadas-srs-candidatos.html

- https://civviva-cidadevelha-cidadeviva.blogspot.com/2021/09/calcadas-de-novo.html

- https://laboratoriodemocraciaurbana.blogspot.com/2022/08/incivilidade-generalizada.html

-https://civviva-cidadevelha-cidadeviva.blogspot.com/2025/04/a-alepa-e-o-tombamento.html

A poluição nos causa espanto, visto o que autorizam na área tombada.

 https://laboratoriodemocraciaurbana.blogspot.com/2025/04/como-continuam-passar-carretas-enormes.html

Mas ainda tem coisa pior, a nivel nacional...e pretendem até anistia.

Como chamar essas pessoas que, aqui, desprezam nossas leis?